terça-feira, 25 de novembro de 2008

A Revolta de 1931

S. Braz, esplêndida e formidável fortaleza dos tempos de Manuel da Câmara, seu Alcaide-Mor e seu construtor, era hoje, 9 de Abril de 1931 um mau quartel de artilharia, sem fosso nem esplanada, com construções acima das ameias onde soldados e oficiais não gostavam de estar. Certo que ficava no centro de Ponta Delgada e vizinho das Festas do Senhor Santo Cristo mas isso era pouco consolo para aquelas dezenas de militares que eram obrigados, por dever de ofício, a trabalhar e a dormir ali.

Na cidade, José Bruno Tavares Carreiro era o todo poderoso político de influências inegáveis que, com fumos de autonomista, servia a Ditadura porque os amigos de Aristides Moreira da Mota consideravam que os militares do 28 de Maio tinham acabado com a barafunda da primeira República e posto ordem nas finanças e no Estado, embora o centralismo desenfreado da Revolução Nacional não fosse propriamente o ideal para quem defendia a “livre administração dos Açores pelos açorianos”. Enfim, a alta política tem destas coisas…

A tarde era calma e, embora o ditado reze que “em Abril águas mil” o sol brilhava em céu sem nuvens e sem vento que nestas coisas de meteorologia o povo também se engana que não só os cientistas. Parecia um dia quente de verão. Quente, abafado e húmido, ainda mais estava no gabinete do oficial do dia onde o clima era de nervos tensos, muito fumo e vozes baixas. Conspirava-se contra a Ditadura Nacional! Sabia-se que os militares no poder não eram nada brandos com os revolucionários ou golpistas, haja em conta o milhar de mortos que em 1927 sofreram os contra revolucionários.

- Vocês fiquem sabendo que se não pararmos o Salazar, vamos ter um segundo Mussolini, dizia o tenente José Esteves, magro, de olhar fixo e sorriso nervoso. A coisa está assente, Lisboa, Porto, Funchal e nós, o resto do País vem atrás como cão de caça em busca de perdiz abatida. E acendia cigarro atrás de cigarro, um no outro, lançando no ar lufadas de fumo que enchiam a sala e faziam arder os olhos. - Não sei, dizia o tenente Manuel de Melo, bonacheirão e bem disposto, democrata até à medula e com uma alergia a ditadores que só visto. Esta coisa das revoluções já deu o que tinha que dar. Vamos é lixar-nos todos se a coisa corre para o torto. Mas não há outro remédio. P´rá frente é que é caminho!

- O Cunha Leal, garantiu-me que todos os deportados alinham; tomar Ponta Delgada é canja e vocês vão ver que nem vai ser preciso disparar um tiro. A população local não se mete que isto são coisas da tropa. O único que pode criar problemas é o Zé Bruno, por isso, tomado o Castelo, vai logo um carro às Furnas buscá-lo que, segundo sei, ele está lá a banhos. Miguel de Almeida, era um oficial brioso, de esplêndida figura, alto, aprumado, era o terror dos pais de meninas casadoiras e pertencia a uma velha família de democratas e militares. Falava em tom pausado, como se ditasse uma escritura pública perante uma assembleia constituinte.

Parecia que todos temiam que a coisa desse para o torto mas, por outro lado, se nada fosse feito, continuariam a vir para o Arquipélago civis e militares castigados, enchendo as pensões e os hotéis (que não eram paraísos nem de comodidade nem de preços). Famílias divididas e destruídas, pouco faltava para os fuzilamentos fascistas da Itália. E se eles não sentirem oposição forte, “é isso que vai acontecer, fiquem sabendo”, sussurrou o Tenente Melo já fora de si.

- E o Caldas de Barros? Não se esqueçam que é militar do quadro e Governador do Distrito. - Ora bem bom, resmungou o Miguel de Almeida, ele não vai querer sarilhos por cá visto que namora com rica moça da ilha. Dele me encarrego eu. – Então, tudo a postos, rematou o oficial micaelense, o único da ilha que ali fazia parte dos conspiradores. E é para já. A coisa então precipitou-se, Almeida sacou da pistola e os restantes, sem discussão puxaram das suas e saíram em corrida.

O Comandante da unidade despachava na sua secretária a reclamação dum recruta que queria emigrar para a América pois tinha casado com uma rapariga de Fall River e precisava duma licença provisória para ir à Lagoa dar o sim na Conservatória, visto que o casamento religioso iria ser mais tarde, na Igreja do Santo Cristo, daquela cidade da Nova Inglaterra.

Foi nesse momento que ouviu uma gritaria na parada e, olhando pela janela, viu uma série de oficiais que corriam de arma em punho em diversas direcções. Poucos segundos depois, batiam com força à porta do seu gabinete. - Entre, disse o comandante um tanto curioso. - O meu Comandante, desculpará mas isto é uma Revolução e tenho de lhe dar voz de prisão em nome do Presidente da República. – Mas o Presidente Carmona é que me nomeou para este cargo, a que propósito iria ele mandar prender-me.

- O meu Comandante não está a perceber, o Presidente da República a que nos referimos é o presidente Teixeira Gomes. Oh Almeida, você está doido? Não percebe que isto vai ser a sua desgraça? E a do seu velho Pai que, como militar pode vir a ser prejudicado por esta sua atitude irreflectida? - Meu Pai não sabe de nada e, se soubesse, não perderia um segundo a apoiar-me. O meu Comandante considera-se preso e serão respeitadas todas as suas honras e patentes? Ou…

Nesse momento entram de rompante no gabinete do Comando todos os outros conspiradores: - O Castelo está nas nossas mãos, o nosso Comandante fará o favor de dizer se está por nós ou contra nós? Na parada ouviam-se gritos de alegria e abriam-se as portas do Castelo por onde entraram diversos civis que abraçavam eufóricos os militares que os acolhiam simpaticamente.

O governador civil já se rendeu. As outras unidades militares já aderiram; foi um fogo que lhes pegou pelas tripas. A Junta Revolucionária da Madeira já dominou a ilha, falta apenas saber o que se passou em Lisboa e Porto. A coisa vai!

Enquanto isso, vários oficiais revolucionários aproximaram-se das ameias norte da velha fortaleza e observavam as correrias do rapazio que nervosamente se aproximava das muralhas seguidos pelos adultos em passo mais ou menos vagaroso, empurrados pela curiosidade duma revolta que era coisa nunca vista por estas bandas. O Alferes Martiniano, de luto recente por familiar querido, olhava com semblante carregado mas indiferente para a pequena multidão que se juntava aos poucos junto da porta de armas do Castelo. - Oxalá que esta revolução saia vitoriosa que, ao menos assim, regresso a Lisboa. Estou farto desta solidão atlântica.

O tempo continuava bom com o céu de azul anil sem nuvens, o mar parecia um lago e a baía da doca espelhava os barcos ancorados sem suspeitar que o país tremia de nervos por uma tentativa de repor a legalidade democrática em que só os mais cultos e envolvidos acreditavam. O navio Pêro de Alenquer dos Carregadores Açorianos era o maior dos barcos na doca. Da Itália e da Alemanha sopravam ventos de autoridade e, em Lisboa, o Ministro da Finanças esgueirava-se para dirigir o governo, esmagar a revolta e mandar sozinho em Portugal inteiro de Minho a Timor, durante 37 anos.

Só que, entretanto, tinha que vencer, pelo menos esta revolta, senão o destino da Península Ibérica iria ser outro nas próximas décadas. A sentinela bradou na sua pronúncia micaelense cerrada: - Meu Alferes, está aqui um civil chamado José Ramos, diz que quer falar com o comandante do Castelo, deixo-o entrar?

Boa pergunta, pensou para consigo o alferes, tentando ver pelas ameias do Castelo qual era a pinta do paisano. – Sei lá, pergunta aí ao tenente Frazão, que ele há-de conhecer melhor o bicho. Ramos, pequeno, nervoso e excitado, vinha trazer um recado de Cunha Leal. Entrou. Foi revistado dos pés à cabeça que esta coisa de revoluções tem as suas regras. – Limpo, disse o cabo Júlio encarregado da segurança. Entrou o Ramos e foi levado à presença de Miguel de Almeida: - Meu tenente, Cunha Leal requisitou o Correio dos Açores, por ser o do José Bruno e o mais lido. É preciso um manifesto à população que ele já escreveu. Precisa o engenheiro de saber quais são os oficiais que o querem subscrever. Fez-se um silêncio pesado na Sala dos Retratos para onde o rapaz tinha sido levado. Todos os presentes concordaram em assinar o documento. Mas Ramos trazia instruções: - O director do jornal vai ser o Ferro Alves, e é importante que assinem o Coronel Álvaro Ataíde e o Tenente Miguel de Almeida. Olharam todos para os visados que sentados em dois cadeirões de madeira de acácia, sentiram a impressão de que a coisa não devia ser bem assim mas, já que era para rebentar que rebentasse, depois se veria. O velho coronel não parecia muito convencido do seu papel de herói que isto da tropa quanto mais alto se está, mais pancada se apanha quando a coisa corre para o torto. Calou-se que às vezes o silêncio é de ouro. Ramos porém, compreendeu isso como consentimento e saiu pela porta fora convencido que levava a chave do tesouro.

Miguel de Almeida, entre apreensivo e divertido, encheu um pequeno copo de aguardente da terra que retirou duma garrafa escondida por detrás duma espécie de balcão e emborcou-o engolindo o líquido com um esgar de quem sentia o álcool escaldar-lhe as goelas e passou os dedos por debaixo do bigode farto. – Ora vamos a ver onde isto vai parar. O coronel levantou-se de vagar e todos se puseram em sentido. Por alguns dias, ele seria a mais alta autoridade dentro do Castelo e os regulamentos, com revolução ou sem revolução, fizeram-se para ser cumpridos.

- Preparem-me a viatura que vou até ao palácio da Conceição ver como andam as modas. O impedido do Coronel estendeu-lhe o quépi, as luvas e o pingalim. O oficial cobriu-se, calçou a luva esquerda, colocando o pingalim debaixo do braço, fez a continência e saiu com passo seguro mas lento. A viatura esperava-o no pequeno pátio nascente do Castelo. Entrou, sentou-se no banco detrás e ordenou: - Para o Palácio. As portas do Castelo abriram-se, o povo começou aos vivas e às palmas, enquanto o carro lentamente, dobrava para o campo de S. Francisco. Ataíde correspondia com continências lentas e firmes.

Carlos Melo Bento
2008-11-11



segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Interessante

Criou uma situação politicamente embaraçosa a ausência, no estrangeiro, do Presidente da Câmara de Vila Franca do Campo, do PSD, durante a campanha eleitoral para as eleições regionais deste ano. Embaraçosa para os laranjas porque, não estando no poder na Região Autónoma, era natural que fizessem fogo a partir das Câmaras Municipais onde saíram vitoriosos nas últimas autárquicas e não era compreensível que o mais emblemático dos presidentes desse às de Vila Diogo num momento destes. Criou Rui Melo uma situação insustentável no seu partido e, ou muito me engano, ou vai ter que haver muita discussão em Santa Luzia (ou perto) para as próximas autárquicas. A aliança política que o vilafranquense fez com Carlos César de que resultaram manifestos benefícios para os serrotinos em termos orçamentais, vai custar um alto preço político. Resta saber a quem. Pelo que parece, Rui Melo goza de grande popularidade entre os eleitores do seu concelho e, aparentemente, ganhará as autárquicas, qualquer que seja o partido por que se apresente. Pode fazê-lo como independente e aí, julgo que pela primeira vez a nível concelhio, teríamos um desafio curioso de seguir, com as poderosas máquinas partidárias a defrontar um poderosíssimo candidato. E, a não ser que os socialistas deixassem de se apresentar para, implicitamente, apoiarem um aliado semi secreto, o resultado seria no mínimo curioso. Caso se apresentassem três candidaturas credíveis, não se vê ainda candidatos que pudessem ombrear com o endiabrado autarca. É um caso que inspira muito interesse pelo ineditismo da situação e pela curiosidade de saber como vão ser as reacções das forças maiores. O PSD lançado numa crise de liderança, começa a perceber o erro de não ter avançado com Berta Cabral no auge do seu prestígio. Neste momento, tudo ali pode acontecer. O PS, jogando de cima, pode ver a sua estrutura concelhia abalada por qualquer solução externa não consensual. E o consenso nunca foi uma característica da antiga cabeça da Ilha do Arcanjo. Isto ficou muito interessante.
Carlos Melo Bento
2008-10-23

Férias Judiciais

O actual ministro da Justiça resolveu reduzi-las ao mês de Agosto. O resultado desta decisão praticamente ditatorial, ou pelo menos autoritária, ofendeu toda a gente que trabalha na Justiça e, o que é pior, não resolveu, antes agravou a situação existente. As Férias Judiciais foram criadas no tempo de D. Afonso V, com as Ordenações Afonsinas, mais ou menos quando os Açores foram descobertos e destinaram-se a dar sossego às cabeças das pessoas em cuja casa a dita Justiça tinha de entrar, pelo menos no tempo das colheitas e das vindimas. Passaram-se os tempos, e esse período passou a ser utilizado pelos operadores judiciários (Juízes, Ministério Público, Advogados e Funcionários judiciais (Escrivães, etc.) para porem o seu trabalho em dia, estudar os casos mais bicudos e (particularmente os advogados) para preparar as acções que davam entrada no fim das férias. No geral, os dois meses de férias reduziam-se na prática a menos que um, pois normalmente os 30 dias não chegavam para arrumar, estudar e preparar processos. Era frequente, muitos dos recursos difíceis serem resolvidos nesse período, pois os juízes portugueses têm o mau hábito de não julgarem em cima do joelho e gostam de decidir com tudo estudado e ponderado. Com este sistema que reduziu as “férias” a 30 dias, o resultado foi que ninguém tem tempo para nada e perante o dilema, descansam mesmo nos 30 dias e não têm tempo para mais nada senão satisfazer as milhentas formalidades processuais com que os medievos legisladores de que dispomos nos atormentam há séculos. Com a agravante de que, não podendo todos feriar em Agosto, escolhem agora, Julho, Agosto e Setembro, tempo em que poucos não dão conta do recado. Antes, os tribunais fechavam 2 meses, agora são 3. Nem sempre mudar é melhor. E quando, alguém com poder se engana, o melhor é dar a mão à palmatória porque, há muito está provado que as medidas demagógicas podem satisfazer os invejosos mas raramente resolvem os problemas.
Carlos Melo Bento
2008-07-26

Turismo

Numa ilha, é evidente que qualquer turista procura água. Límpida. Transparente. Se possível com peixes de fascinantes cores, formas e tamanhos. Procura também sossego. Um pouco de sol, paisagens de sonho e algumas compras, normalmente de coisas que não servem para nada ou para fazer inveja ao vizinho menos afortunado ou para oferecer à família de que não nos lembrámos na azáfama das precipitadas visitas mais ou menos programadas.
Nós temos tudo isso em quantidades incríveis e um clima ameno e sempre primaveril que deixa as Caraíbas e quejandas a perder de vista, tendo em conta que são insuportáveis e mal sãs estufas de águas mornas e fedorentas. Mas, cuidado, as nossas águas mercê da nossa tendência para a porcaria, estão a ficar sujas e tão baças que mais parecem aquelas que ladeiam as grandes zonas industriais desse mundo de Deus. Entre nós, são as ribeiras para onde se deita o lixo como se vivêssemos ainda na escassez do século XIX onde o pouco que se punha fora até de adubo servia; são as lixeiras públicas a céu aberto colocadas em pontos demasiado perto da costa que, em vindo um ventinho mais forte, ali vai porcaria a dar à costa na praia mais próxima, quer seja uma estonteante e bizarra Ferraria quer uma Areia mosteirense por mais azul que seja a bandeira lá posta. Já não basta a falta de fiscalização aos barcos de todas as nações que resolvem fazer das nossas águas territoriais sumidouro para as suas imundícies, como também a inexistência de largas zonas de protecção que impeçam os barcos movidos a motor de se aproximarem dos paraísos do descanso e laser turístico que são por isso as minas de ouro que têm de estar ao serviço de todos os que aqui querem melhorar de vida. Os nossos mares estão a ficar sem peixes e, quer-me parecer que não só devido às pescas intensivas e ilegais. Depois vêm os carros e as motos sem escapes ou com eles muito abertos (onde está a fiscalização?) e com os altifalantes tão altos que parecem aviões de combate no Iraque, na hora de ponta dos bombardeamentos. Sem águas transparentes, sem peixes, com lixo e com barulhos insuportáveis o nosso turismo está condenado senão houver um pulso de ferro que corte a direito.
3 de Setembro de 2008

Chumbada

O Presidente vai vetar de novo o Estatuto, caso a Assembleia não aceda aos reparos quanto aos seus poderes. Não farei discussão jurídica desta questão por enfadonha. Ninguém perceberia nada e, quando se trata de direito político, que é outro nome para o direito constitucional, o jurídico tem muito pouco lugar e o político muito, e só vale a pena tratar dos jurídicos quando todos estão de boa fé. Mas a discussão pública deste caso, mostra que Cavaco Silva teve duas intervenções estranhas, na Televisão em que pregou um susto ao Povo (que olhou para o lado a disfarçar o sorriso malino), e outra, dando uma entrevista ao Público que nem é o jornal mais lido nem é imparcial politicamente. Estranho, realmente. Que argumentos? Que diminui os poderes do Presidente que tem de ouvir as instituições autonómicas antes de dar cabo delas. Ora, não está dito em parte nenhuma que o seu parecer seja vinculativo, pois o presidente é obrigado a ouvir argumentos mas não é obrigado a segui-los. Se ouvir uma pessoa antes de a condenar é diminuir poderes ao juiz, eu vou ali e já volto que está muito calor. Nem chega a ser argumento. Cheira a desprezo. Ouvir os fedelhos? Era o que mais faltava! Salazar fez isso com os africanos, mas agora regem a democracia e o Povo é quem mais ordena?!? Outro argumento que não colhe é o de ter de ouvir uma pessoa mais duma vez, por ele ser conselheiro de estado, chefe de governo e líder partidário. Hoje são a mesma pessoa, amanhã podem não ser, digo eu. E sendo o mesmo, no aperto de mão final, dirá: - Como compreende não o ouço nas outras qualidades porque já sei o que vai dizer. Resposta: -Claro senhor presidente, seria uma chumbada!

Térmitas

Há questões que realmente se não percebem. O escaravelho japonês ataca as culturas, na Terceira, e os dinheiros públicos, e muito bem, são colocados â disposição dos investigadores e das vítimas da praga para debelar os seus desgraçados efeitos. Certamente que os americanos da base terão sido chamados delicadamente à pedra porque foi por seu intermédio que a nipónica criatura chegou até nós.
As térmitas invadiram S. Miguel vindas também da América, destruindo a madeira das nossas casas, devastando as nossas traves mestras e os barrotes que sustentam os telhados e os sobrados e têm de ser os prejudicados a pagar o preço da inércia e a incúria das autoridades portuguesas e americanas. Então não eram os americanos obrigados a vigiar as madeiras que traziam da terra deles e utilizavam na nossa terra se estavam limpas também dessa praga? E se o não fizeram, não são responsáveis pelos prejuízos que a sua incúria nos está a causar? E as autoridades alfandegárias portuguesas não tinham obrigação de vigiar os materiais importados daquele país e mandar recambiar os impuros? E porque o não fizeram não são elas as co-responsáveis pelos prejuízos que nos causaram? Sendo inconstitucional que as autoridades regionais interfiram nas relações internacionais, onde estava o senhor Presidente da República que não mandou ao Tribunal Constitucional esta inacção dos responsáveis como tão zelosamente mandou o nosso famigerado Estatuto? E não tem ele agora a obrigação moral de nos mandar limpar as ilhas dessa praga e promover que se nos paguem os prejuízos que nos causaram? Aguardemos que o guardião do centralismo cumpra as suas obrigações que foi para isso que a maioria dos açorianos votou nele.
3 de Agosto de 2008

Eleições

Vai começar a sério a campanha eleitoral para as legislativas regionais que o Chefe de Estado marcou para 19 de Outubro próximo futuro. Até aqui, fora as picardias do costume entre o PS e o PSD que nos habituaram há anos a um jogo de disse e contra disse que ninguém entende nem leva a sério, nada de novo. César com milhões faz obras como ninguém fez antes, e no geral (sejamos justos) fê-lo com tino e mestria, Berta Cabral (sem milhões) faz também coisas incríveis de que só um verdadeiro génio é capaz. Todavia, ela não é chefe da oposição, colocando-se numa posição secundária que não augura nada de bom para a turma laranja, pois Costa Neves é praticamente ignorado em S. Miguel, ilha que, quer se queira quer não, decide tudo. Para além disso, César namorou Rui Melo e o aconchego vai de vento em popa com vantagem para os dois. Para César nas regionais e para Melo nas autárquicas que se avizinham também. Restam os pequenos partidos para quem César criou, magnânimo, um circulo de compensação que, pensa ele, levá-los-á Assembleia. Não estou tão certo disto porque os pequenos partidos, tudo espremido, ainda ficam abaixo dos restos, pois não têm nem casas nem subsídios nem empregos para oferecer e, portanto, ficarão outra vez à deriva. Talvez o PDA (onde milito) tenha alguma hipótese de recolher por sorte, da nova lei algum proveito, mas isso depende do desempenho de José Ventura que só agora passou para o segundo ano da Universidade e ainda está longe do DR que tantas portas abre. O eleitorado volúvel quer ver caras e programas para se decidir e aí, o bota abaixo do Bloco de Esquerda atrai os maldizentes, e o fascínio pelos dirigentes nacionais (que atrai os açorianos na política e no futebol contra os seus próprios valores) pode ter uma palavra a dizer. Por outro lado, os comunistas têm uma militância monolítica que não diminui nem aumenta mas ocupa um lugar. Tudo visto, parece que os socialistas vão ganhar com larga maioria, e os pequenos partidos, onde incluo o CDS/PP correm o risco de desaparecer.
Ponta Delgada
2008-09-10

Uma Campanha Morna

Acabou a campanha eleitoral e por ela se ficou a conhecer, pelo menos, o feitio dos principais candidatos que tiveram de dar a cara pelos partidos que dirigem ou parecem dirigir dos Açores. Isto porque, à excepção do PDA, as delegações locais dos restantes partidos, por força dos seus próprios estatutos nem candidaturas podem apresentar sem assinatura dos presidentes nacionais de cuja boa vontade dependem.
A campanha foi relativamente morna e absolutamente dispendiosa para os maiores partidos que despenderam milhões de euros em propaganda, almoços, jantares, camisas, transportes etc. não sei de onde vem esse dinheiro todo mas tais verbas cheiram a promiscuidade com gente de dinheiro e isso não é bom para a democracia, pois o capital deve ser servo do Estado e não seu dono e, geralmente, quem paga gosta de ser bem servido. Em política desde há milhares de anos, que “a mulher de Júlio César não deve apenas ser séria mas deve parecer sê-lo”. E esta promiscuidade faz parecer que há qualquer coisa de pouco sério nesta imagem que os grandes partidos transmitem. É verdade que o eleitor que conta comer de graça ou receber camisas ou esferográficas sem pagar está-se nas tintas para quem paga logo que seja ele a receber. Porém, no meio de tanta gente há-de haver pessoas sérias para quem a desonestidade é desonestidade qualquer que seja o outro nome que lhe dêem.
Li por aí que se deve votar em branco como forma de protesto. Não há diferença política entre votar em branco e abster-se ou seja, não votar. Porque quem tem mais votos é que governa e ponto final. Quem, com um mínimo de inteligência quiser votar contra o que está, não vai para a América, não se abstém nem vota em branco. Vota em alguém. Vota naquele que lhe merece mais confiança, no que tiver o melhor programa ou no que pode fazer mais mossa ao que governa e de que o eleitor eventualmente não goste. Tudo é preferível ao café com leite que não é uma coisa nem outra uma espécie de indivíduo que não é homem nem mulher antes pelo contrário.
Outra questão é a dos dinheiros públicos. De todos os partidos que concorrem a estas eleições, o PDA é o único que não recebe dinheiro do Estado mas é de todos aquele a quem o Tribunal Constitucional aplica mais multas por virtude duma lei antidemocrática. Primeiro porque havendo um Tribunal de Contas não faz sentido que seja o tribunal Constitucional a fazer as suas vezes. Depois porque não se percebe porque um partido que tem um orçamento anual de menos de mil contos (5.000€), cada vez que aparece um papel que não obedece às regras ou um atraso na apresentação daquelas, se lhe aplica multas muito superiores ao orçamento anual. A não ser que o objectivo seja fechar-lhe as portas mas então aí que se assumam como se assumiram quanto ao número de militantes, cuja lei tiveram que engolir para não fechar os outros todos que, sendo também úteis à democracia, estavam nas mesmas circunstâncias. Se o Povo Açoriano desse alguns votos ao PDA talvez os poderes soberanos e neocolonialistas percebesse que existimos e temos consciência disso.
Carlos Melo Bento
16 de Outubro de 2008

A diferença

Natália Correia, a maior poetiza portuguesa do século XX, na opinião abalizada de Sousa de Oliveira (o fundador da arqueologia científica nos Açores) teve um contacto muito intenso e íntimo com o movimento independentista açoriano que surgiu depois da descolonização portuguesa. Face ao espectro político existente, ela dizia alto e bom som (nunca falou doutra maneira) que os independentistas faziam a diferença.
As coisas evoluíram como se sabe, o peso de Mota Amaral arrasou as restantes forças e tudo se diluiu nesta autonomia em permanente crise de crescimento e consolidação com contradições insanáveis que levam os autonomistas a querer avançar por necessidade e os centralistas a fazê-la recuar por interesses inconfessáveis.
A nossa representação parlamentar na Horta ou em Lisboa não é por isso indiferente, visto que temos de ter em conta o que os Açores precisam e não o que os outros querem. Qualquer deputado que não tenha consciência de que só podemos viver bem nestas ilhas com muita luta e com muito esforço não merece ter os nossos votos. Não se vota por amizade nem por interesse pessoal. Deve votar-se por convicção. Convicção é uma espécie de crença. Acredita-se que fulano é bom para conduzir o barco ou não é. Se é, deve votar-se nele mesmo que se não goste da sua maneira de vestir ou do tom de voz. Ninguém procura um médico por ser simpático ou bem cheiroso. Procura-se aquele que dê a cura porque o sabe fazer.
Hoje já ninguém sabe qual é o partido dos ricos e o dos pobres porque não há pobres nas direcções de nenhum deles. Os ricos encostam-se sempre aos que mandam e aos que podem. Os pobres ou têm inteligência para escolher entre eles o que melhor lhes serve ou serão pobres toda a vida. E para se deixar de ser pobre não basta ter uma casa e um subsídio. Há que ter instrução e estudo pois essa é a única riqueza que os impostos não podem tirar a um ser humano. Parece que os chineses é que dizem: não dês o peixe, ensina a pescar. Nem mais.
Carlos Melo Bento
1 de Outubro de 2008

Para cá do Marão...

O Presidente da República enviou ao Tribunal Constitucional o Estatuto Açoriano depois de aprovado por impressionantes unanimidades nas Assembleias legislativas açoriana e portuguesa. Sempre me bati contra a necessidade da sua reapreciação pela Assembleia da República cuja legitimidade democrática para esse efeito é mais do que duvidosa para julgar um diploma que só diz respeito a uma Região cuja autonomia política e administrativa é um facto consumado interna e externamente.
O gesto do Presidente diz-se estribado em pareceres de vários juristas; não é todavia inocente. Não tem a Assembleia açoriana acessoria jurídica suficiente para garantir que o diploma não é inconstitucional? Não tem a Assembleia da República dos melhores juristas do país e não foram eles consultados antes da aprovação unânime dos Pais da Pátria, aqueles mesmo que aprovaram a Constituição? Serão os juristas do Presidente melhores que os da Assembleia, órgão legislativo que o Chefe de Estado não é? Por outro lado, a imagem de imparcialidade do Tribunal Constitucional não é propriamente imaculada. Formado por juízes de nomeação política ele é, sem o ser, um Supremo Tribunal de Justiça. A sua existência, cópia do francês, é um absurdo lógico e jurídico. Primeiro porque não há nada acima do “supremo” ou a gramática é uma batata. E juridicamente, o Supremo Tribunal, desde a sua criação em 1832, é a última instância da ordem jurídica portuguesa para onde têm de dirigir-se todos os recursos. Criar uma instância superior à do Supremo é um erro. Devemos conformar-nos com o que o Constitucional decidir ou, já agora que o Supremo já não é supremo, devemos apelar para as instâncias internacionais se aquele beliscar o unânime Estatuto? A lógica manda esperar para ver, embora se esteja mesmo a ver desde já. O que não quer dizer que, politicamente, se não vá fazendo algumas ondas para que se perceba que para cá do Marão mandam os que cá estão.
8 de Julho de 2008

A Jóia da Coroa

Vila Franca do Campo é a jóia da coroa do turismo açoriano não só em termos de belezas geográficas únicas no Mundo, como pelo seu património arquitectónico sem igual, pela riqueza arqueológica sem paralelo no mundo português, pela etnografia ímpar, pela gastronomia caseira única e manifestações religiosas e populares que serviram de alicerce a tudo o que nesta ilha existe e perdura na diáspora açoriana do Brasil e das Américas em geral.

Para não haver dúvidas actualmente de que o turismo será o sucessor da agro-pecuária como solução económica para a presente conjuntura e tudo se tem conjugado para que a próxima década pelo menos viva dessa actividade. As baterias governamentais açorianas sob a presidência de Carlos César apontaram com aparente êxito para o sector que cresceu a olhos vistos e vem trazendo alguma riqueza para os nossos quase desanimados operadores económicos.

Mas Vila Franca tem de ser a mola real dum turismo que se quer irresistível em qualidade e durável. De tanto vermos a beleza incomparável do ilhéu, a mais formosa piscina natural do mundo, esquecemo-nos da potencialidade ali concentrada, desde espectáculos de luz e som com narrativas históricas, até ao banho de mar sem paralelo para todas as idades e classes, resguardado do diabólico barulho dos pacóvios apanhados na armadilha dos altos sons duma duvidosa e ruidosa musicalidade que tudo estraga, passando por espectáculos nocturnos de músicas de encantamento que não haverá Caraíbas que as valham.

A espectacular paisagem da Senhora da Paz quer na sua festa pela que a humanidade sofrida tanto aspira quer nos estonteantes dias solarengos de Verão que uma boa empresa de entretenimento seleccionado transformará em inesquecível acontecimento para qualquer mortal.

A arquitectura patente nos vetustos templos de S. Miguel, Santo André, Misericórdia e S. Pedro, ou nos conventos, na Casa dos Padres Mestres, nos recuperáveis Castelos do Tagarete e Taipas, no Palácio do Conde ou nas casas do Capitão Mor ou dos pombalinos Paços do Concelho que marcaram épocas e pessoas e serão percursos sem par.

A arqueologia vinda da primeira vila da expansão portuguesa guardada há 500 anos no subsolo à espera que outro Sousa de Oliveira a traga à luz do dia (para quando Universidade nossa?).

A procissão de S. Miguel única na Europa com as artes e ofícios valentemente sobreviventes das revoluções culturais que assolaram o velho continente e que esperam o estudo dos curiosos do passado comum. O S. João vibrante de alegria e vida, a nossa caldeirada, o pão de milho a cebola curtida a massa sovada, sem comparação possível com nada deste mundo, tudo isso são galões que têm de ser puxados nesta disputa do melhor e mais bem feito para o bem de todos.
Rui Melo, traduzindo uma velha aspiração vila-franquense quer que a Vila seja cidade e tem razão mas há que aproveitar o seu dinamismo e potencial político inegáveis para fazer desta terra, não a velha capital da Ilha mas a nova capital do turismo açoriano e sua jóia mais cara.
Carlos Melo Bento
2008-06-21

Inteiramente

Portugal é um dos mais antigos Estado da Europa, entendendo-se como tal a Nação politicamente organizada. Nervos essenciais do estado são as forças armadas e o sistema económico – financeiro, a tal ponto que, quando um destes sectores entra em crise, o estado periga e, no geral, transforma-se. Nos estados de mercado livre, a economia e as finanças assentam na banca, depositária das poupanças e dínamo dos investimentos. Quando a banca espirra o estado constipa-se. Por aqui se vislumbra o perigo que nós todos corremos na presente situação, emergente duma crise bancária à escala planetária e que embateu com violência inaudita no tal nervo, num impacto que abalou todos os sistemas internos, desde a empresa à moradia, desde o emprego à mesa. Abismados, assistimos ao revelar de indícios de graves tropelias, num sector que deve ser inteligentíssimo mas que tem de ser integérrimo. Parece que, afinal, nem uma coisa nem outra, com a agravante de se pretender agora conspurcar o mais alto órgão de soberania do estado. Nunca ninguém se atrevera a tanto desde D. Carlos I e deu o que deu. Há algo por detrás desta furiosa e estranha tempestade que está mal explicado. O País não devia ser joguete na mão de gente sem escrúpulos nem sujeitar-se a ser defendido por ingénuos passivos, sem coragem para impedir ocorrências gravíssimas que nos podem perder a todos. A Justiça por melhor que seja (e é) não previne nem governa. É altura de se exigir aos que pagamos para isso que cumpram os seus deveres. Inteiramente!
Carlos Melo Bento
2008-11-24

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Gratidão


Qualquer que tenha sido o motivo de deixarem os órgãos supremos da autonomia açoriana, os que agora saem e exerceram os respectivos cargos com desinteresse material e sacrifício das suas vidas profissionais e familiares só merecem dos açorianos profunda gratidão. Terão acertado, terão errado nas decisões que tomaram, nos planos e opções que em nosso nome adoptaram, não importa tanto como o facto de terem aceite agir em nosso nome por idealismo, por espírito de servir, por ambição de marcar a história com a sua inteligência e acção, por tudo isso temos de ficar-lhes gratos. Não há pior regime do que aquele que é exercido por mercenários sem ideal que não seja encher as barrigas, empregar os filhos e conseguir reforma que lhes garanta um fim de vida sem problemas. E os que saem sem fazerem isso, têm o benefício da dúvida se mais não houver para provar que ali estiveram ao nosso serviço que não do deles próprios. Certamente que alguns não compreenderão porque motivo os seus serviços deixaram de ser necessários, úteis ou oportunos mas esse juízo não lhes compete fazê-lo. Churchill na glória máxima da vitória sobre o Eixo, perdeu as eleições. A mulher para o consolar insinuou que talvez fosse uma graça de Deus. O “Leão inglês”, respondeu: - “Se é, está bem escondida”. Talvez sim e talvez não, o que não pode é ter-se a reacção de Salazar quando viu a grande manifestação a favor de Delgado:- “Ingratos!”. Quem serve não espera gratidão; ou a merece ou não.
Carlos Melo Bento
2008-11-18

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Relíquia

Os Açores são a relíquia dum vasto império que um pequeno povo temerário e heróico fundou nos quatro cantos do mundo, criando nações e estados incrivelmente maiores que ele próprio, onde milhões e milhões de pessoas falam a sua língua, crêem na mesma fé, usam as mesmas leis, amam os mesmos desportistas e se comportam como co-fundadores dessa tarefa gigantesca que nos coloca a todos, sem motivo de vergonha, ao lado dos maiores e mais poderosos. Relíquias, escrevi eu, não jardim zoológico em que uns tantos teimam em ver ridículos laboratórios onde se experimentam teses ou se põe e dispõe como em casa alheia, ao sabor dos caprichos de políticos sem dimensão nem génio. O destino e o viver dos açorianos é, antes de mais, assunto que só a eles interessa e só a eles compete decidir. Não aceitamos tutelas. Podemos ser vítimas de atropelos cobardes mas não vergamos a nossa vontade a ditadores de pacotilha e a Napoleões de cartão. Não embarcamos em cruzeiros de jurisprudências servis. Somos gente. Somos cidadãos de cidadania completa. Somos autónomos não colonos duma qualquer potência novecentista nem pertencemos a roçados mapas cor-de-rosa, cartas de jogar em tabuleiros de duvidosa racionalidade. Quem não se sabe governar não tem legitimidade para querer governar os outros. Quem não manda em sua própria casa não tem boca de falar na casa dos outros. Deixem-nos em paz. Quem quiser fazer melhor que venha viver de vez para cá e, então, será como nós.
Carlos Melo Bento
2008-11-11

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

O Tsunami

O momento é incerto e perigoso. O capitalismo que tanta riqueza gerara no mundo ocidental, propagando-se à Ásia como fogo em pólvora, atravessa uma crise que arrasta o sistema que parecia sólido como rocha. O fantasma de Marx e a sua profecia apocalíptica surgem do sótão das coisas esquecidas, fazendo tremer os que julgavam o materialismo dialéctico morto e enterrado. Uma grande abastança abatera-se sobre o mundo capitalista, com casas luxuosas, carros de milhares, cruzeiros de fantasia, saúde gratuita, ensino ao desbarato, comércio a rodos, tanto que, no delírio do consumo, as pessoas nem pensam nas dívidas que durante anos as amarram aos bancos e às suas hipotecas, às empresas de crédito contra incertas declarações de IRS, a troco de computadores, telemóveis, jogos electrónicos, vídeos e aparelhagens de preços e efeitos incríveis, internetes de mirabolantes e imediatas comunicações para qualquer ponto do planeta, GPS de orientação inaudita que até dispensam pilotos ou guias, ginásios que se esfalfam a desfazer as gorduras duma alimentação excessiva e barata que a todos deforma, e tudo o que nem a mais delirante imaginação podia prever. Inesperadamente, a banca, nervo e mola real do sistema, dá um grito de dor e parece submergir no meio duma overdose de lucros e progresso transformados em falências e burlas impensáveis. No aparente remanso do nosso cantinho, porém, vão chegar as ondas do tsunami que abalará a vivência idílica em que despreocupadamente temos vivido. Não duvidem.
Carlos Melo Bento
2008-11-04