terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Até Quando?


Prisioneiro sem remédio da açorianidade, meditei nos emigrantes, a propósito (não sei bem porquê) dos Romeiros. Na rádio, um deles explicava que a Romaria servia para pensar no porquê da vida, no que fazíamos por cá e no destino que nos aguardava. Nunca tinha pensado na questão por esse prisma e pareceu-me que tinha sentido porque, no dia a dia, sem tempo para nada, a vida começa e acaba sem ser percebida porque nunca se pára para pensar nela. O mais estranho foi isso resultar dum micaelense, o mais aparentemente insensível dos açorianos que afinal, em lógica simples, explicou o secular costume de um grupo de homens largarem trabalho, mulher e filhos por largos dias e esfalfarem-se numa corrida a pé batido à volta da ilha sem outro rumo que não seja voltar ao lugar da partida. Menos sorte tiveram as centenas de milhares que emigraram no século XX, à média de 5.000 por ano e os da primeira geração que por lá nasceu, alimentados pela mesma raiz cultural sem poderem regressar nunca. Quantas lágrimas de saudade, quantas dores de afastamento, quantas agonias de morte suportou essa imensa multidão? Desorganizados, desperdiçados, abandonados, por misérias e trabalhos sem conto em terra alheia, entre estranhos, vivendo apenas da memória do verde, do odor do incenso das festas e do tão triste adeus da partida que a geração seguinte (que lhes é roubada) perde no turbilhão de vivências desconhecidas. Até quando a Pátria Açoriana os deixará abandonados em tal sorte?
Carlos Melo Bento
2008-02-12

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