domingo, 30 de dezembro de 2007

Guia Turístico da Igreja Matriz de Ponta Delgada

por Carlos Melo Bento

A igreja Matriz de S. Sebastião, da cidade açoriana de Ponta Delgada, é um templo de estilo gótico português semelhante aos que no reino foram construídos no início do reinado de D. Manuel I, com algumas distinções ( N. 106 ) [1]. O actual edifício não foi o primeiro ali construído, visto que antes dele ergueram os primeiros povoadores outro mais pequeno, sensivelmente no lugar ocupado pela capela de Nossa Senhora do Rosário, a nordeste da capela maior. Quando da primitiva igrejinha de S. Sebastião que ainda existia em 1525 ( N 102 ) esta tinha um poço de água no adro. Com a construção da nova Igreja, este poço ficou dentro daquela Capela ( a nascente ).
Não se sabe quando foi construída a primitiva igreja mas certamente muito antes de 1514. Foi o seu 1.º Vigário Diogo Anes que viveu muitos anos. O primeiro Beneficiado foi Rui Fernandes que faleceu de cem anos. O primeiro Cura foi João Soares da Costa cujo pai, Afonso Anes Colombreiro, o mouro velho, faleceu na subversão de Vila Franca, em 1522. Sua mãe era Joana Soares, da casa da Capitoa D. Filipa. Foi bom sacerdote e foi ainda o 3º vigário de Santo António além Capelas. O 1º Mestre de Capela, pago pelo Rei, foi Sebastião Ferreira, tendo esta Capela tanta fama que podia comparar-se a qualquer outra “Sé de grossíssima renda”. (GF,I,308). Hoje, 2001, preside como Pároco, a esta Igreja, Monsenhor José Ribeiro.
O autor do plano original do actual templo ainda é desconhecido ( N. 98 ).
De 1523 a 1531, ocorreu em Ponta Delgada a Grande Peste, que dizimou grande parte da então Vila de Ponta Delgada.
Neste último ano de 1531 o Capitão do donatário da ilha de S. Miguel, e a sua mais alta autoridade, Rui Gonçalves da Cãmara ( antepassado directo do actual Conde da Ribeira Grande, D. José Gonçalves Zarco da Câmara, residente em Lisboa ), com o seu ouvidor ( o 6º que os donatários micaelenses tiveram ) o licenciado João de Teve ( que viria a exercer no reino altos cargos judiciais ), em cerimónia pública que teve lugar no Campo de Rui Lopes Barbosa da Silva que se situava a nascente de Ponta Delgada, e na Casa do segundo Corregedor de S.Miguel, António Borges Gamboa, o contador, com grande pompa e circunstância, desimpediu Ponta Delgada (até então interdita), porque há meses não morria ninguém de peste. Aos guardas e homens da governança do Concelho deu-lhes juramento e proclamou a vila por desimpedida.
Tomaram então o mártir S. Sebastião por intercessor e mandaram fazer-lhe uma igreja maior, que começou a construir-se entre 1525 e 1533 e em 1545 já nela se praticavam actos de culto.
Tem esta Igreja corpo rectangular de três naves, dividida em sete tramos por oito pares de colunas, com fustes cilíndricos em pedra de lioz ( hoje coberta de gesso ).
Luis Bernardo diz que deverá ter sido um templo de planta crucial românica, os braços da cruz eram formados pelas duas capelas actualmente da invocação do Coração de Jesus e dos Reis Magos, posição de que discorda Nestor Sousa pois considera que a Matriz tem um falso transepto, como o da Igreja de São Sebastião da ilha Terceira com que tem aliás outras similaridades.
Tinha os capitéis campaniformes com ornatos classizantes de óvulos recortados no ábaco quadrangular, figurações esculpidas a quebrar-lhe os cantos e pequenas estrias entre os astrágalo e aquele remate, tudo hoje coberto de gesso ( N. 104 ). E, bases de socos quadrados, escócias e toros de mármore.
Em 1550, os governantes da cidade consideravam-na, não sem orgulho, “Uma igreja que é das melhores que há em todo o Reino” (Arq. Aç. III, 453 ) quando há poucos anos em relação àquela data que estava aberta ao culto, há tão pouco tempo.
É uma igreja de modelo puro, embora modesto, da arquitectura portuguesa de 500 (LB III 427).
“Poucas igrejas haverá em tão bom lugar situadas; é de bom grandor, de naves e muito alta, com uma graciosa torre de relógio ... e outra fortíssima ( GF.I,306 ). E ficava nos seus princípios na Praça da Vila, tinha a Câmara de fronte, e junto dela estava o porto e a Alfândega(id.ib.).
É delineada em cruz, com frontispício virado a poente, terminado num frontão em ângulo obtuso, com rosáceas, rematado por cruz e sob ele a portada central.
Vejamos então a história da sua construção. Os Vereadores da Câmara da então ainda Vila de Ponta Delgada, Sebastião Barbosa da Silva (“fidalgo mui discreto e generoso e grande dizedor, que morava na sua Quinta da Fajã, termo da cidade de Ponta Delgada, onde tinha sua fazenda, e ali faleceu, sendo muito velho” (GF,I,42) e Gaspar de Viveiros (“chamado Castelhano por ser casado com uma mulher castelhana”, (GF,I, 306 ), foram os encarregados pelo município de adjudicar a obra a mestre Lupedo ( talvez autor do projecto, talvez canteiro, talvez espanhol, N. id.ib ), que a arrematara relativamente à pedra para a Igreja, pela enorme quantia de um conto (ou seja um milhão ) e trezentos mil reis; o arrematante recebe então 100.000 reis por conta e envia do reino para onde se desloca, muita pedraria de mármore para os portais principal e sul - e peares (todas as colunas que sustentam este grandioso templo apesar de cobertas de gesso, são, como se disse, de mármore ), que deve ter sido trazida por Afonso Fernandes por aquele enviado do reino para o substituir, pois a mulher recusou-se a acompanhá-lo para tão tenebrosas partes oceânicas.
Os nossos Reis não se alheavam das obras mais importantes nestas ilhas, pois também lhes pertencia a mais importante fatia dos impostos aqui cobrados. Por isso, em 22 de Agosto de 1532 – D. João III – doou desses impostos, 400 cruzados para ajuda das obras do templo, na condição de o Povo dar 4.000 ! devendo a Câmara obter certidão destes ao Contador d’El Rei e ao Padre Dominicano Mestre Afonso de Toledo ( castelhano, irmão do arcebispo de Toledo e parente próximo do duque de Alba, envolvera-se na questão das “comunidades” em Espanha, sendo Abade de Tantale. Dizem alguns que previu a subversão de Vila Franca, mas confortou os sobreviventes e promoveu a construção da Igreja de Nª. Srª. do Rosário do Convento Franciscano daquela Vila ) que, por via disso, tomaram conta das despesas efectuadas. Um mês antes, el-rei dera um cálice de prata dourado, um turíbulo e uma custódia também de prata, para esse templo consagrado ao santo, homónimo do monarca seu neto que lhe sucedeu no trono, para o que deu ordem a Martim Mendes Tesoureiro da Câmara Municipal ordem nesse sentido (LB III 397). Parece portanto que tais peças de culto terão sido efectuadas por ourives micalenses. Ourives da época em São Miguel, são entre outros: Mateus de Lima, Cristovão Dias, Cosme Damião, Manuel Nunes e Miguel Pereira (LB 111 399).
Vejamos então quem governava Ponta Delgada em 13 de Janeiro de 1533: os Vereadores Álvaro Lopes o Cavaleiro, morador em Santo António e Manuel de Matos, ( filho de Fernão de Quental, casou com Isabel Nunes de Portugal, foi pai de António de Matos e de Fernão do Quental, o moço ) os Juizes Ordinários Amador da Costa ( da poderosa família dos Arrudas da Costa, residia em S.Roque, e foi em sua casa que se instalou o rei D. António, Prior do Crato em parte do tempo que esteve nesta ilha. Foi ele que levou dois cavalos bem ajaezados e o seu moço de esporas de rica libré, no jogo de canas que o donatário Rui da Câmara organizou, na Lagoa, a seguir ao dilúvio de Vila Franca do Campo para animar o seu Povo ). e Gaspar Camelo Pereira ( morava nas Feteiras, seu pai era fidalgo dos Camelos de Portugal, que veio de Castelo Branco com grande fausto de criados e escravos. Seu avô Pero Cordeiro foi o primeiro notário da ilha e dos seus primeiros povoadores; foi pai do juiz dos órfãos de Ponta Delgada ). o Procurador do Concelho: Fernão Vaz Cabêa. Procuradores dos Mesteres: Afonso Anes e Álvaro Miranda. Pois são estas autoridades municipais que adjudicam por arrematação a Estevão da Ponte e a Afonso Machado ( seu filho foi também mestre de obras e a ele se deve a construção da Capela com abóboda com corochéu alto e o portal da igreja do Convento de Jesus que existiu na Ribeira Grande ), a obra, visto que também o Afonso Fernandes acabou por não vir, alegadamente por ter sofrido um acidente.
Por seu lado, os Portais e Peares foram lavrados por Nicolau Fernandes ( extremado oficial ) e por seu irmão André Fernandes. Aquele fez também a Ermida primitiva da Mãe de Deus por encomenda da viúva de Diogo Afonso Cogumbreiro ( homem rico e poderoso que viveu em Vila Franca e Ponta Delgada, à Mãe de Deus ), porque Diogo Dias, o carpinteiro da Matriz se desaveio por causa do preço com o dono da obra, a qual foi demolida por razões militares durante a Grande Guerra de 1914-18, e substituída pela actual, paga por subscrição pública. Mas a alvenaria da Matriz foi feita pelos irmãos Estevão e Braz da Ponte
A importante obra de carpintaria foi efectuada por Diogo Dias e Pêro Fernandes, da cidade e Diogo Álvres de Água do Pau.
O corpo da Igreja nova foi acabado em 1545 ( N. 103).
Vejamos agora em pormenor cada uma das partes deste famoso e formoso templo que acolheu dois reis e uma rainha de Portugal e onde ocorreu tudo o que de importante, em reflexo religioso, aconteceu na história da ilha depois da sua construção. Os Bispos faziam nela pontifical e a Câmara da cidade e a nobreza dela assistiam a “todas as funções públicas”.
Embora já em 1674, alguns anos depois da Restauração da nossa independência do domínio espanhol, pouca ou nenhuma assistência havia aos ofícios divinos e os legados pios estavam por cumprir. Isso não impediu que em 21 de Agosto de 1699, o Bispo D. António Vieira Leitão mandasse fechar todas as Capelas com grades “para maior resguardo das coisas dedicadas ao culto divino”.
Em 1726, possuía um vigário, doze beneficiados, dois curas, tesoureiro, mestre de Capela, organista e quatro moços de coro.

A Porta Principal

A porta principal da Matriz de S. Sebastião, possui elementos semelhantes ao portal sul dos Jerónimos, de sóbria monumentalidade e originalidade compositiva, que o distingue dos numerosos modelos dos portais Manuelinos ( N. 110).
Tem este portal ”como limites laterais assentes em envasamentos altos de formas geométricas compósitas percorridas por angulosidades, erguem-se dois contrafortes com nichos abertos e pináculos terminais ornados de “crochets”.
Entre eles, a composição do portal desenvolve-se com sentido de profundidade, definida superiormente por amplo trilobado, cujas hastes arredondadas, tornadas colunelos, descem até envasamentos de composição idêntica aos dos contrafortes.
Em forma de crossa e menores, os lóbulos laterais; em querena lanciolada o central...
Da convergência destes arcos pendem grossas pinhas esculpidas, apontadas obliquamente sobre o vão, em posição diametralmente oposta às que sobre a parede, fazem irradiação com o gabelete que remata a querena central, bordejadas de folhagem estilizada.
Elementos heráldicos coroados preenchem os tímpanos dos lóbulos menores. À esquerda as armas reais; à direita escudo com setas de S. Sebastião. No tímpano central, a modesta expressão gótica de dois anjos alados limita o nicho vazio de escultura, cuja mísula, entre dois consolos de acentuados enrolamentos, remata o vértice do arco contracurvado, com radeações laterais, saído do entrançado que, em forma de hexágonos abertos, pela sobreposição de três colunelos, emoldura o intradorso do amplo vão do portal...
Entre as duas molduras da composição, o pano de cada lado é preenchido por nicho com baldaquino concheado, cuja mísula de recortes convexos e figurações zoomórficas de expressão escultórica renascentista, serve de capitel a colunelo torso de troncos de árvore, ladeado de “crochets” , o qual, por sua vez, abre-se inferiormente, em pequeno sarapanel e acolhe fruste baixo relêvo com representação de figura humana segurando cartela em geito de pergaminho desenrolado.
“...Curiosa composição de elementos de natureza diversificada, a que não falta sóbria monumentalidade e originalidade compositiva “ diferente de todos os outros portais manuelinos existentes por esse mundo fora. (N.110)


Fachada Principal

A fachada existente já não é igual à primitiva, segundo o Pai da História d’Arte micaelense, o frontão teria três espelhos de coro manuelinos, correspondente às naves, com sua cimalha lavrada e destruída no séc. XVIII (L B 396).
De facto, em 5/11/1726, o Visitador Licenciado João de Sousa Freire, determinou que a fachada da Matriz fosse modificada e que lhe abrissem janelas ( e lhe pusessem novas cobertas nas naves laterais, elevando-as para altura coerente com a da nave central).
E em 20 de Julho de 1729 ( N. 124 ) o Doutor Luís de Sousa Estrela, visitador geral em nome do Bispo D. Manuel Álvares da Costa, mantém as mesmas ordens do antecessor e manda elevar os tectos das naves à altura do corpo principal e abrir-se-lhe janelas.
Em 25 de Novembro de 1733, são essas obras autorizadas pelo marquês do Alegrete ( N. 125 ).
Actualmente, conforme ensina o Professor Nestor de Sousa, essa “fachada (está) compartimentada em três corpos longitudinais por pilastras pouco salientes que se sucedem em escala diferente, elevando-se as do corpo central a maior altura assentes sobre socos simples superiormente arredondados” ( N 125 ).
Tem “três cimalhas, interrompida no corpo central a do primeiro plano para conter o portal Manuelino, cortam horizontalmente a superfície plana por altura dos capitéis das pilastras, definindo um reticulado com espaços de formas e dimensões diferentes” ( N 125 ).
Dois pares de alongados e rebordadas volutas, de espirais em oposição, constituem a recortada cornija que remata superiormente o frontão, por bojudas pinhas lisas e as centrais se acostam para suportar a cruz do frontispício, sem acrotério.
“No primeiro plano, ladeando o portal manuelino, abriram-se dois portais correspondentes às naves laterais, espécie de amplos nichos de arco joanino emoldurados por colunas pseudo-salomónicas, pilastras de corpo com folhagem em alto relevo, volutas e acantos de acentuado recorte, com concheado superior envolvido por estilizações fitomórficas de gramática barroca e sentido volumétrico”.
Colunas e pilastras assentam sobre envasamentos com cachos de frutos em relevo.
Quatro vãos se rasgam sobre os portais no segundo plano, correspondendo uma janela a cada nave lateral e duas ao corpo central, de molduras rectilíneas, com ombreiras ladeadas por coluna pseudo-salomónica e verga dupla com salientes terminais” (id.ib.).
No pano rectangular central, entre a cimalha principal e a que suporta as volutas de coroamento do frontão, abriu-se um óculo de moldura oitavada ondulante”.
“Apresenta afinidades com o formulário maneirista... obra de híbridas ondulações decorativas barrocas”, à mistura com elementos da arquitectura manuelina.

O Portal Norte

Este portal é todo de basalto, de mais simplificada composição decorativa definido superiormente por arco conupial repetido, encimado por trilobado, cujo lóbulo central é cortado pela moldura de arcos convexos, de cujos vértices radiantes saem gabletes com decoração vegetalista.
A base sobre que assentam os três pares de colunelos é de configuração geométrica simplificada.
No pequeno tímpano central recurvam-se duas fitas simetricamente opostas, com enrolamentos terminais (N. 111).


Portal Sul
O lindíssimo portal sul é o mais equilibrado e requintado, mainelado, de arco abatido com moldura repetida, esbelta coluna espiralada entre os dois vãos, com capitel de figuração humana esculpida em relevo à maneira renascentista. Colunelos laterais com idênticos capitéis ladeiam intercolúnios decorados com figuras exóticas. Medalhões, jarros floridos e outra decoração vegetalista. Os arcos plenos dos vãos apresentam-se recortados com trilobado. Dois medalhões encimam o portal, concentricamente moldurados, contendo dois bustos em baixo relevo, sobrepujados ao centro por querena lanceolada que se articula com arcos convexos, cujos vértices, irradiantes, terminam em gabletes. Como limites laterais superiores de composição, dois coruchéus, esguios com seus pináculos terminais”. Os bustos têm indumentária Quinhentista N. III, talvez de D. João III e D. Catarina, que reinaram durante a construção do templo. Apesar dos esforços de Luís Bernardo, não está definitivamente assente a identificação dos personagens representados. Mas não me parece que pudessem, ao tempo representar reis fora da porta principal (ver o caso dos Jerónimos, por exemplo), para além de que nenhuma das figuras mostra atributos da realeza, o que é no mínimo estranho. Não se tratará antes de doadores, quem quer que tenham sido?
Mainelado, de arco abatido com moldura repetida esbelta coluna espiralada, entre dois vãos, com capitel de figuração humana tipo renascença, combinados laterais com decoração vegetalista.(id.ib.)

Torres
Este templo, até ao século XIX, a norte da Capela Mor, possuiu “uma alta e graciosa torre do relógio”, onde havia residência do vigário, arquivo paroquial e ouvidoria do Distrito Eclesiástico. Neste último século vandalismos arquitectónicos impostos por modas hoje unanimemente condenadas, fizeram desaparecer esse elemento primitivo tão original e curioso.
A torre dos sinos ( e hoje do relógio ) foi construída pelo mestre António Gonçalves (LB 11, 241) “fortíssima”. Em 1575 ainda faltava acabar a torre dos sinos, talvez o colarinho abaixo da última cimalha, o qual acabaria por ser feito pelo Pedreiro Bento Soares ( L B III, 412 ), na mesma altura em que se lhe comprou um sino por 32.650 reis (L.B. 424). Porém, em 1590, ainda não estava acabada.
O actual relógio, foi o benemérito António Joaquim Nunes da Silva por testamento de 1895, quem deixou à Câmara oito contos para o adquirir, eventualmente preocupado com a falta de pontualidade dos seus concidadãos.
Foi coberto sobre o eirado, acentuando a desproporção com o fontespicio e dependências laterais hoje demolidas (N.id.ib.).
Aliás, durante a sua longa existência esta matriz foi objecto de obras que a foram descaracterizando até a transformarem no que ela é hoje, um tanto o reflexo da maneira de ser dos micaelenses. Muito importantes embora discutíveis foram as que em 25/11/ 1733 o Marquês d’Alegrete manda fazer para reparar “prontamente” a igreja.

Sacristias
As Sacristias e as Capelas mores das Igrejas paroquiais eram da responsabilidade do Rei ( N 100 ).
Sacristia do Lado Norte
Quando a sacristia desta igreja é feita de novo à custa da Fazenda Real, ainda lhe faltava forrar o arco da Capelinha, pintar esta, e o tecto da Sacristia, pondo-lhe uma guarnição de azulejo por baixo.
Do mesmo modo, em 20/VII/1532, D. João III ordenou ao seu tesoureiro Martin Mendes que entregasse dois pontificais para a Sacristia ( N. 101 ).
Esta divisão do Templo mais importante da actual capital micaelense é constituída por uma quadra onde em pesados e inestéticos gavetões se guardam os paramentos, que deve vir do séc. XVIII. Os seus azulejos, mesa e armários assim o indicam. Uma fonte dela separada por arco, apresenta decoração seiscentista (L B III 412). A mesa com pés em forma de dragão como motivo ornamental deve ser do séc. XVII (LB 1, 77).
Possui um painel pintado em tábua, representando o menino entre os Doutores, sem assinatura, mas datado de 1620, feito talvez por um dos nossos artistas de então, Baltazar Rebelo, Diogo Soeiro, Manuel Correia. Todas as paredes são revestidas de azulejos seiscentistas de pintura solta, interessante colecção do tipo dos da Igreja do Colégio. L.B. id. ib., de origem portuguesa, período de transição do desenho geométrico para o historiado.
Os azulejos têm apenas figuras isoladas, com remate nos quatro cantos, cruzes entremeadas com pontos, ou envolvidas sem semicírculos ou por triângulos, oitavando a placa ornatos que simulam peças de fixação de tijolo, os “pregos”.
São pintados a traço azul sobre branco em geral, de tons vigorosos, com duas graduações em geral, o ultramarino puro nos planos escuros e aguado nos cleros, fixado com firmeza e feitos com qualidade ( LB III 413 ). De pintura larga e veloz sem hesitações, sem emendas ou correcções, sem preocupação de apuro mas espontânea.
São de artistas humildes e no geral têm interesse artístico e etnográfico, espelho da alma popular.
Em 1631, foram feitas obras de pedreiro e carpinteiro importantes nesta sacristia.
Em 1716, são adquiridos os armários por 600.000 reis e em 1718 e 1730, os azulejos nas paredes do norte e parte das do nascente e poente, apresentando caçadas, do vigoroso desenho em azul sobre branco, que custaram 342.000 reis, além dos que forram os lambris.
Em 1732, são-lhe comprados ornamentos e é pintada. Esta sacristia é uma das poucas peças intactas da Matriz não destruída no séc. XIX ( LB III 427).
A mesa da sacristia da matriz de Ponta Delgada de madeira exótica do brasil, tipo nacional com tremidos e torneados, outrora pertencente aos Jesuítas, é talvez trabalho de artistas micaelenses séc. XVIII ( LB II, 43).

Sacristia Sul
Tem este cómodo duas casulas consideradas de enorme valor, talvez trazidas pelos Jesuítas no séc. XVI.
Uma delas aparece na sua forma primitiva a outra com duas dalmáticas idênticas foi restaurada depois; a intacta é de veludo carmesim, bordada a prata; um braço é dourado, com lavores e figuras bordadas a sedas de cor.
Nelas estão representados trechos da paixão de Cristo, Santos, Santas e Apóstolos.
Na restaurada, só restou a faixa central, sendo tudo o mais feito de pedaços de veludo carmesim adamascado a fio de prata. Na faixa central Santos alternando com escudos e armas.
Como estas casulas vieram do Colégio de Jesuítas, supôs-se que teriam pertencido ao Cardeal Fisher ( João ) decapitado em Londres em 22/06/1535 por ordem de Henrique VIII de quem fora preceptor e trazidas para São Miguel pelo Jesuíta Luís Tavares filho do primeiro Guilherme Fisher.
Todavia, A. Walleston Franks, Chefe do Departamento of British and Medieval Antiquities do museu britânico considerou que o brazão de armas referido pertencia a John Grandission, barão bispo de Exeter de 1327 a 1369, sendo as outras armas as reais inglesas, antes de alteradas em 1405.
O Prior Jacinto da Ponte organizou aqui neste recinto um pequeno museu sacro onde em vitrine foi guardando as peças melhores:
- Um frontal rico de altar mor que com um pluvial do mesmo género foi trazido do Colégio dos Jesuítas, bordado num lavor intricado, composto por rosas, palmetas e volutas, a prata e ouro sobre cetim carmin e dividido em cinco panos juntos e orlados por entremeios largos do mesmo tecido parecendo destinado a passo de púlpito mantendo-se da primitiva a orla e o sebasto.
- Uma banqueta de prata, que era da Igreja de Santo André com castiçais de dois tipos, trabalhados, produção da ourivesaria continental do 1.º quartel do séc. XIX e
- As duas referidas casulas.

Capela de Nossa Senhora do Rosário
Está esta capela situada do lado norte da Capela – Mor; o retábulo em talha dourada veio da Igreja dos Jesuítas ( ou do Colégio ou de Todos os Santos ), com a imagem de São João Baptista Machado, Jesuíta terceirense martirizado no Japão mas que não foi ainda canonizado e outra de S. Luís Gonzaga.
Em 1516, João Gonçalves Albernaz, o Tangedor, que deve ter sido o seu fundador, deixa a esta Capela 23 alqueires de terra ( um alqueire, medida antiga, tem 1393 metros quadrados ), para nela se lhe dizer, às terças feiras, missa cantada pelos vigários, ataviados com vestimentas de damasco. Está lá sepultado (LB III 389).
Há porém quem diga que seu genro Francisco Dias Caiado – Juiz e Vereador de Ponta Delgada, falecido em 1543, e também lá sepultado é que instituiu esta Capela antes de 1516. Por sua vez, o genro deste, António Monforte, marido da Marquesa Gonçalves, em seu testamento ( de 1569 ) manda que seja enterrado nela. Trata-se pois dum jazigo familiar, visto que todo o cristão era sepultado dentro dos templos, sendo que os mais poderosos criavam e sustentavam capelas onde as suas almas eram permanentemente recomendadas ao Criador.
O retábulo do altar, ali existente antes de 1760, era da invocação do Senhor do Lado Aberto, cuja bela imagem, em alto relevo, o Dr. Luís Bernardo ( 1883 – 1955 ) ainda encontrou na arrecadação da matriz, e está hoje colocada junto à Capela das Almas, por determinação acertada de Monsenhor José Ribeiro. Toda a talha desta Capela é valiosa embora de autor desconhecido mas de influência italiana, talvez da 1.ª metade do século XVIII (id.ib.).

Capela do Coração de Jesus
Esta Capela, situada a sul do cruzeiro, era antigamente, talvez, de Nossa Senhora da Soledade, cujo retábulo dourado veio do Convento da Graça, no princípio do séc. XX por diligências do Padre Jacinto da Ponte.
Tem a imagem de Jesus entre dois vitrais que representam S. Francisco e Santa Margarida de Mamacoque, mandados colocar pelo Cónego João Pereira Dâmaso.
Na sua abóbada artesoada, o florão central é armoriado, os restantes fechos têm três figurações humanas, Jerónimo Jorge, sua mulher Beatriz de Viveiros ( encomendadores da Capela ) e Frei Jerónimo, dominicano, filho do casal.
Tem o arco exterior trilobado, arquivoltas de decoração floralista no intradorso, dois pares de colunelos sobre envasamentos de composição geométrica tudo em lavas basálticas visivelmente sacrificadas ( N. 108 ).


Capela de São Pedro
Que antigamente foi dos Santos Reis Magos, a norte do Cruzeiro, cujo retábulo dourado também veio da Igreja do Convento da Graça ( 1910 – no princípio do séc. XX por ordem do Padre Jacinto da Ponte ), com a imagem de São Pedro, preso em Roma, quando o Anjo lhe aparece.
O quadro dos Reis Magos que lá existia, ficou inutilizado.
Em 1693 tinha larga “Fábrica” mas ainda não tinha altar de frente.
Foi fundada por Pedro Afonso “o escudeiro” e sua mulher Beatriz Rodrigues ( Nestor Sousa diz que é “Isabel Roiz” ) em 6 /VII/1504( ao lado da senhora do Rosário”, como refere em seu testamento ).
Foram seus edificadores Gaspar de Viveiros e sua mulher Isabel Castanho ( ele Vereador em 1528 e 1533 ) ( N. 109 ).
Possui esta Capela abóbada artesoada de pano único, em que da confluência inferior dos arcos formeiros quebrados, apoiando-se sobre mísulas de forma e decoração renascentistas, que se alternam, partem arcos, segmentares que entroncam no artesoado, desenhando estrela de quatro pontas, com roseta circular radiada de arcos segmentares. A chave central com busto de homem ( N. 109 ), talvez o fundador ou o construtor.

Capela do Senhor dos Passos
Esta Capela era antes da invocação do Bom Jesus ou Jesus Cristo e do Nome de Deus foi mandada levantar, por Pedro Jorge e sua mulher Ana Gonçalves por testamento de 4 de Janeiro de 1525 .
Ele era filho de Jorge Velho, sobrinho do Rei de Fez e de sua mulher África Anes ( filha de Gonçalo Anes e de Catarina Afonso ) povoadores de São Miguel.
Ordenou que lhe fosse cantada, cada ano, uma missa por Diácono e Subdiácono e várias missas rezadas.
Cada missa teria três pães e um quartilho de vinho e uma candeia acesa e cinco candeias acesas em memória de temperança das cinco chagas de Nosso Senhor Jesus Cristo”.
Na missa cantada, treze pães com uma vela três vezes dobrada, acesa, e doze alqueires do melhor trigo, doze canadas de bom vinho, dois carneiros e trinta reis em ceitis “ofertadas por mão do povo que na igreja estiver”, à honra e memória dos trinta dinheiros porque Judas vendeu suas culpas e pecados”.
Esta missa era celebrada na Capela Mor, com quatro círios acesos, pelos evangelistas, e duas tochas ao evangelho e do prefácio por diante e sobre a sepultura de tampa aberta doze tochas ou vinte e quatro círios e nos outros altares dois círios em cada, muito incenso e “sinos tangidos à honra e piedade de Deus”. Tudo pago pela Terça dos seus bens...
Em 24 de Agosto de 1555 Aires de Oliveira e Maria Simoa – mandam enterrar-se na cova do seu pai João Álvares, neste altar, deixando-lhe rendimentos para os “responsos sobre a sua cova”.
Em 31 de Março 1696 o vigário Simão da Costa Resende em nome de Bispo, diz que a Capela é administrada pelo capitão Manuel Rebelo da Câmara.

Capela de Nossa Senhora da Glória
Esta Capela que em 9 de Março de 1572, é também nomeada por Nossa Senhora da Assunção, foi mandada levantar por Gaspar do Rego Baldaia, junto da Capela de Jerónimo Jorge, “será de abóbada, com um arco de muito boa obra, de pedra da Ribeira Grande e lajeada de pedra da Vila Franca e uma campa com suas armas, de pedra de Liós de Portugal”, deixando a quem cantar meio ano de missas ( meio anal ) 10.000 reis...

Em 31 de Março 1696 / 21 Agosto 1699, administra esta Capela o Capitão Francisco do Rego, com pouca diligência até 1699, pelo menos.

Altar de S. João Baptista
É todo em talha, com imagem de São João e a seus pés a de Nossa Senhora de Fátima.
Em 31 de Março de 1696, administrava-o o Capitão Agostinho de Medeiros.
Em 21 de Agosto de 1696, administra-o o Capitão Manuel Pereira da Silveira como tutor dos netos.
Entre o altar de Nossa Senhora da Glória e o do São João Baptista houve antes dois altares que foram retirados.
O prior Jacinto da Ponte encomendou a valiosa talha, no início do século XX, aos hábeis entalhadores Araújo, da Ribeira Grande (L.B. III 428).


Capela de Nossa Senhora da Conceição,
Que antes era da invocação de São Roque, e agora 2005, tornou a ser, foi fundada por António de Brum e sua mulher Maria de Frias antes de 1608.
Em 21 de Agosto de 1699, administra-a Tomaz de Brum, e tem o retábulo por dourar. O procurador do Administrador é Bartolomeu da Rocha que é intimado pelo Bispo para o dourar. A desobediência terá levado a que o altar passasse a ser de Nossa Senhora da Conceição, administrado pelo Padre João Martins Machado, que se manda enterrar nela ao lado do irmão, o Desembargador António Martins Machado ( 30 de Junho de 1706 ).
A imagem de São Roque que presidia inicialmente a esta capela, já existia no séc. XVIII, e acha-se relacionada com a tradicional festa da Pombinha (LB III 425).
Na referida Imagem de São Roque “O heróico Santo sustém um livro na mão esquerda, a cabeça coberta com o sombreiro de peregrino e junto dele vê-se o cão amigo que lhe trás um bolo para seu sustento; a encarnação e o douramento da roupagem , bem levantada, devem ser os primitivos (L. B. I, 405).
É em madeira, de escultor desconhecido, com expressão suave, de júbilo pelo fim da peste de 1673, de que resultou na segunda feira da Pascoela uma missa cantada ao Espírito Santo”.

Altar de Santo António
É este altar de fundação recente; os meninos do coro celebravam a festa do seu patrono, com esmolas pedidas pela cidade.
A talha foi elaborada no princípio do séc. XX pelos hábeis artistas Araújos ( da Ribeira Grande ) por ordem do Prior Jacinto da Ponte, que também mandou restaurar talhas do séc. XVIII que estavam em arrecadação.

Capela do Baptistério
Retábulo de São João Batista na cena do Jordão.
É também chamado de Altar das Almas. Possui um quadro pintado por Giorgio Marini, de apreciável equilíbrio de composição, bom desenho, com técnica cuidada e minuciosa.
Este pintor, regressou à Itália em 1870. O homem ao fundo de barba castanha curta é auto-retrato de Marini (LB II, 216).

Capela de Nossa Senhora da Alegria
8 de Outubro de 1689 – Gaspar Camelo Pereira diz em seu testamento que, se morrer em Ponta Delgada, quer ser enterrado “na Capela de Nossa Senhora da Alegria, lado norte”, na cova do seu avô do mesmo nome. Ignora-se hoje onde seria esta capela.

Adro
As obras que o alteraram foram efectuadas antes da visita régia de 1901.
Do lado sul possuía uma série de lojas ou tendas de barbeiro que muito afectavam a estética exterior, pelo que a sua substituição pela escadaria actual veio favorecer o aspecto exterior do templo.
Do lado poente, a remoção do gradeamento em ferro pode também Ter permitido uma visão mais completa da fachada principal, mas não é pacífica esta opinião.

Frestas
5 pares de frestas, irregularmente dispostas, foram rasgadas no segundo andar da nave central mas não foram abertas na prumada das colunas, como se usava no século XIII português ( Santa Clara de Santarém ) nem sobre o eixo dos arcos como no séc. XIV português ( Batalha ), disposição que se verifica também na igreja Matriz de São sebastião da ilha Terceira com que tem aliás outras afinidades.

Coro
Possui o coro da Matriz um órgão magnífico comprado em 1735, por 430.000 reis e só depois pintado e dourado.
Este monumental instrumento musical foi restaurado nos finais do século XX, por
Só em 1750, foi feito o cadeiral deste coro.
Possuía o coro da matriz os 4 painéis hoje existentes na Ermida de São Brás. São pintados cada um em sete tábuas:
1.- Descida da Cruz: Cristo amparado por três figuras. Presentes São João, a Virgem e Madalena chorando. Ao fundo castelo com torres pontiagudas, um dos soldados usa trajes portugueses do século XVI.
2.- Aparecimento de Cristo a São Tomé.
3.- Cristo e Madalena.
4.- Cristo levando a Cruz.
O autor conhecia perspectiva; estas obras são dum colorido vivo, e execução larga nos panejamentos.
Os modelos de Cristo e no do homem que auxilia a sua descida parecem ser micaelenses.
De notar porém que no princípio do século XX, o Prior Jacinto da Ponte comprou em Lisboa telas para o Coro e Sacristia.

As gárgulas do lado norte
Poucos anos antes de 1946, as belas gárgulas que existiam no lado norte da Matriz foram espatifadas prelos pedreiros encarregados de desaguar o telhado, que ali colocaram canos embutidos na parede, apesar de protesto do Dr. Luís Bernardo e do seu pedido para serem guardadas no Museu de que foi director.
Representavam monstros e mascarões.
As que lá estão agora foram colocadas no último quartel do séc. XX, pelos Monumentos Nacionais, durante as importantíssimas obras de restauro que o governo levou cabo.

Capela – Mor
Era toda em talha dourada, grande e majestosa com imagem de São Sebastião orago da igreja e padroeiro da cidade.
Nesta Capela, em 1547, foi sepultada D. Guiomar de Sá, viúva de Gaspar Bettencourt ( N. 103 ). Antes de 1522 – na Capela Mor da antiga igreja foi sepultado Gaspar de Bettencourt por mercê real e para a mulher e filhos podendo sobre ela manter suas armas penduradas, em bandeira de seda, como teve até que se fez a nova igreja. Não é de admirar que aquando da construção da nova igreja, os seus restos mortais tenham também ali sido colocados, pois como vimos sua mulher, falecida depois dele, jaz ali, no exercício dum direito concedido por mercê régia feita àquela importante família de Ponta Delgada
Esta Capela comunicava com os altares colaterais por dois vãos de volta perfeita com “composição formal e decorativa” ( N. 105 ). O do lado sul da epistola com dois pares de colunelos sobre evasamentos de composição geométrica, de lado contrário, conjugam-se ilhargas ornadas de quadrifólios com colunetos, repousando sobre pedestais altos, com figuração de serpentes e estilizações fitomórficas afrontadas.
José de Fontes é o entalhador a quem em 21/01/1750 –e 27/10/749 – é pago o cadeiral (N. 125), bem como o arco do cruzeiro com “madeira entalhada barroca” (N 125) que custou 360.000 reis (LB III, 424).
É o seu retábulo de esquema arcaizante pelo seu reticulado, uma das características gerais das igrejas maneiristas portuguesas do séc. XVII. ( N. 126 citando Robert Smith ).
Cobertura ( N. 106 ): Abóbada de pedra constituída por dois panos artesoados com nervuras de duplo desenho estrelado de quatro pontas e quadrifólios centrais arredondados, os feixes de arcos segmentares, independentes da estrutura dos dois tramos de arcos formeiros quebrados, rompem de mísulas, hoje inexistentes.
Três florões centrados fecham as nervuras no sentido de profundidade da abóbada, funcionando o do meio de forma elíptica, como elemento de articulação dos dois passos.
Na bifurcação dos cruzamentos de artesões são visíveis os vestígios de bocetos.
No séc. XVII deve ter vindo o azulejo que revestia a capela mor da Matriz, ladeando o retábulo de Francisco Teixeira, e que tão bem se harmonizaria com a abóbada de pedra lavrada. Sabe-se que em 1555, Francisco Teixeira construiu o primitivo retábulo e que Fernão de Matos, pintor, fez a obra de pincel e ouro desse retábulo.
O autor do retábulo foi artista importante, no seu tempo, tendo até, em 1583, sido admitido como irmão da Santa Casa da Misericórdia de Ponta Delgada.
Por volta de 1730, esta Capela Mor é dourada por 2.253.000 reis.
No século XIX, fez-se um janelão na face leste da parede (LB III 427).
O antigo arco em Talha da Capela Mor que fora retirado no séc. XIX, foi restabelecido e colocado no seu lugar por ordem do Padre Jacinto da Ponte que encarregou o famoso entalhador da Ribeira Grande Pedro de Araújo Lima, filho e neto de entalhadores que viveu nos séculos XIX e XX de restaurar o altar mor da Matriz.

Capela do Santíssimo Sacramento
Situa-se esta Capela no lado sul ou da Epístola junto à Capela Mor.
Gaspar Frutuoso, diz dela ( portanto antes de 1591 ): “com riquíssima confraria de ricos, devotos e curiosos confrades que a têm provida de bons ornamentos e das mais ricas peças de toda a ilha” .
Sabe-se também que Luís José de Medeiros, ourives e cinzelador de prata foi o autor dumas varas de pálio e ciriais da confraria que governava esta Capela ( L B 11, 140).
Tão sagrado era este lugar que em 30/09/1674, o Bispo D. Frei Lourenço ordena que não se enterre nela pessoa alguma, “de qualquer qualidade ou condição que seja”.


Conclusão
Este despretencioso guia não é mais que uma pequena compilação do que disseram os autores referidos na bibliografia sobre a Igreja maior de Ponta Delgada. Meu Tio avô, o Padre José Augusto da Silva, seu Prior, e Ouvidor Eclesiástico da Cidade, na passagem do século XIX para o século XX, tinha por regra admoestar o pároco de S. José quando o sacristão desta igreja se atrevia a tocar as trindades antes da Matriz, acto que simboliza a autoridade dum templo que a todos nós marcou.
È uma pequena homenagem que lhe faço, em memória da Igreja que ele tanto amou e por cujos trabalhos se lhe encurtou a vida. Faço votos para que quem ler este opúsculo e for rezar à Matriz, sinta como eu o peso dos séculos e da beleza que eleva as almas à morada do Criador.

Carlos Melo Bento

[1] As referências entre parentesis dizem respeito à bibliografia que vem referida no fim deste trabalho, sendo a letra identificativa do autor e o numeral da página do livro estudado.

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